Entre o Vale e o céu
Meus olhos seguem teu vale encantado
E olham para ti, rara beleza,
Lá nessas águas, no teu leito amado
Os peixes a saltar na correnteza
Meus olhos nesse azul, silenciosos,
Caminham pelas margens do Varosa
E ouvem esses sons melodiosos
Das águas da cascata em polvorosa.
O meu olhar contempla o azul do céu
O mesmo azul, aquele azul do rio
Que um peito apaixonado enterneceu
Naquele beijo intenso, tão vadio.
Meus olhos, quais frutinhos de avelã,
Contemplam na manhã o alvorecer
E pela noite o cheiro da romã
Deseja no teu rio a adormecer.
Do céu as aves vão chegando em bando
No seu regresso ao lar, o doce lar
E olhando as tuas águas, vou sonhando
Com tudo o que ainda tens para me dar.
Mulher Cristo
Cativa nas muralhas do Mosteiro,
A Mulher Cristo, triste, soluçava,
E o vento era o seu nobre mensageiro
Que as novas, pelas gentes espalhava.
Seu peito, mergulhado em nostalgia,
Doía com o tempo a não a passar
E pela noite ou quando à luz do dia
A Mulher Cristo orava sem cessar
Na sua cela de pequeno espaço
Um nó sua garganta sufocava
Andava e contava cada passo
A ver se algo a tranquilizava
Ouvia essa suave melodia
Que sua mãe há muito lhe ensinara
E tinha a solidão por sua companhia
Até que o sol à noite lhe escapara
Durante tanto tempo na masmorra,
Logrou perder a vida em cativeiro
Menina e moça como fora outrora
O tempo lhe foi vil e traiçoeiro
Na sua cela a Mulher Cristo orava
A Deus o pai, pedindo a salvação
Com crueldade a vida a maltratava,
Madrasta foi de um nobre coração.
Meu amor ausente
Quando rompe a aurora a cascata chora,
As águas aflitas murmuram baixinho,
Estou tão sozinha, o que faço agora?
A cascata chora por meu amorzinho. …
O rio é bravio pois procura alguém
Corre pelo vale com forte corrente
Meu amor me disse não ser de ninguém,
Que seu coração era meu somente….
Mouras, ninfas que o vale encantais
Vinde proteger-me nesta madrugada,
Lindas estrelinhas que no céu brilhais
Ó, não acordeis a musa encantada
Sinto o burburinho da cascata amiga
Que ao descer o rio se faz melodia
Às vezes parece cantilena antiga
Nesse turbilhão pela noite e dia
Os tons outonais, ao entardecer
O meu coração, querem encantar
Mas minha alma chora, sinto-me a sofrer
Porque não te sinto, não te posso amar.
Poemas de Rosa Maria Santos