Poemas de Ana P de Madureira
***
há uma névoa
que me desfoca certezas
cavando
o contrário do profundo
sobre a finura da pele
onde as lágrimas se deitam
sem cisnes
e estaco no molhado
na ânsia que a neve caia
sob a incandescência do sol
sem os pregos
da melancolia
em que escureço
sombra metálica
agoniando
os caules partidos
de falaciosos jardins
desferidos pelos golpes
de uma espada armadilhada
porque no teu avesso
apenas conhecia
as mãos e os versos.
***
serei tantas
quanto as reflectidas
nos fragmentos
da minha intensidade
extensões de mim
pela calada
que íntima se faz lua
no avançar da noite
inquietando-me os dedos
apagando as sombras
onde em chamas clandestinas
te chamo saudade
onde começas?
onde acabo?
indefinição entre o que toco
e o que sinto
incompatibilidade desmedida
entre o que alcanço e o que sonho
clivagem
até que de novo me invadas
e eu múltipla criatura
te arda como Mulher
***
embolias
as que atam as palavras
e electrocutam os gestos
estáticos
à surdez do mundo
quarto sem janela
ou lâmpada
apenas o brilho memorizado
de um punhal que fatiou o rio
outrora uno
agonia do sufoco
da pele agora longínqua
caída no abismo
onde os beijos
se deitam inodoros
sem hálito
como se de pedra
fossem as asas dos anjos
©Ana P de Madureira